Impor a própria fé a outros com discurso de superioridade é intolerância religiosa, desqualificando crenças alheias.
A tentativa de exorcizar a própria fé em detrimento das crenças alheias, por meio de um discurso que se julga superior, configura intolerância religiosa e acarreta a obrigação de reparação. Seguindo essa linha de pensamento, o magistrado Douglas de Melo Martins, da Vara de Interesses Difusos e Coletivos de São Luís, determinou que dois homens e uma mulher paguem uma indenização de R$ 5 mil por danos morais coletivos.
É fundamental expulsar do convívio social atitudes que buscam purificar a diversidade de crenças, a fim de promover a harmonia e o respeito mútuo entre os diferentes credos. A decisão do juiz reforça a necessidade de exorcizar comportamentos que desqualificam e agridem a fé alheia, reafirmando a importância de coexistir pacificamente em uma sociedade plural e inclusiva.
Exorcizar a Intolerância Religiosa
Uma manifestação em frente a um terreiro de candomblé na capital maranhense visava ‘exorcizá-lo’. O local, vítima de intolerância religiosa no Maranhão, foi palco de um evento que foi além de meras palavras de ordem. O discurso dos manifestantes tentava estabelecer uma hierarquia entre as crenças, sugerindo uma suposta supremacia religiosa por parte deles, como observou Martins.
A ação civil pública movida pela Defensoria Pública do Estado do Maranhão foi considerada procedente pelo juiz, que identificou uma situação grave de intranquilidade social, resultando em danos relevantes na esfera moral da coletividade. O grupo liderado pelos réus, provenientes de duas igrejas, promoveu a manifestação em frente à Casa Fanti-Ashanti durante uma festividade em homenagem ao orixá Ogum.
Com um carro de som, faixas e panfletos, os manifestantes anunciaram a intenção de ‘expulsar os demônios’ do terreiro de matriz africana. Imagens mostram os acusados segurando Bíblias e estendendo as mãos para ‘exorcizar’ o local e seus adeptos. O juiz concluiu que houve uma conduta intolerante, manifestada através de violência verbal e simbólica contra as convicções religiosas da Casa Fanti-Ashanti.
A sentença foi fundamentada no artigo 5º, inciso VI, da Constituição Federal, que garante a igualdade de todos perante a lei e a liberdade de consciência e crença, incluindo o livre exercício dos cultos religiosos e a proteção aos locais de culto e suas liturgias. Outros dispositivos constitucionais também foram citados, como o artigo 3º, inciso IV, que estabelece a promoção do bem de todos sem preconceitos, e o artigo 5º, inciso XLI, que pune qualquer discriminação atentatória aos direitos fundamentais.
A laicidade estatal, consagrada no artigo 19, inciso I, foi destacada pelo juiz, que ressaltou a importância de garantir o pluralismo religioso. Apesar do Brasil ser majoritariamente cristão, o sincretismo religioso está presente na identidade cultural do país, incluindo as religiões afro-brasileiras.
O juiz reforçou a procedência da ação civil pública ao lembrar o artigo 208 do Código Penal, que tipifica condutas de escárnio público por motivo de crença religiosa, e o artigo 20 da Lei 7.716/1989, que considera crime de racismo o vilipêndio a atos ou objetos de culto religioso. A intolerância religiosa deve ser exorcizada da sociedade, garantindo o respeito às diferentes crenças e manifestações espirituais.
Fonte: © Conjur
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