Ilana Pinsky, psicóloga e pesquisadora, discute saúde mental na sociedade. Estudos indicam que moldar características mentais pode melhorar a vida.
Rina enfrentou o desafio do envelhecimento cognitivo com determinação e otimismo. Mesmo com o passar dos anos, ela continuava ativa e envolvida em suas atividades diárias. Além disso, mantinha sua mente ativa por meio de jogos e leituras frequentes, o que contribuiu para preservar sua cognição.
O processo de envelhecimento é natural e inevitável, mas Rina mostrou que é possível envelhecer com qualidade de vida. Mesmo na idade avançada, ela se dedicava a cuidar de si mesma e dos relacionamentos com suas amigas e familiares. Sua dedicação em manter a cognição em idades avançadas era admirável e inspiradora para todos ao seu redor.
Envelhecimento Cognitivo e a Importância do Trabalho Voluntário em Idades Avançadas
Antes mesmo de se aposentar do trabalho de professora primária, já se engajara em trabalho voluntário na Ofidas (atual União Brasileiro Israelita do Bem-Estar Social), onde assumiu várias funções. Me lembro dela me contando da visita que fez ao grupo de idosos da associação, quando ela foi supervisionar as atividades realizadas com os ‘velhinhos’. Na época, ela já era mais velha do que quase todos eles. Tinha temperamento tranquilo, era conciliadora, empática, organizada. Inusitada trajetória, considerando ser a caçula de uma família de quatro irmãos imigrada da Ucrânia, cujo pai havia morrido dois meses antes de seu nascimento. Rina era minha avó e faleceu uma semana antes de completar 100 anos. Viveu uma vida plena na maior parte deles.
Pelos dados de 2022, os brasileiros têm uma expectativa de vida de cerca de 75 anos (79 para as mulheres e 72 para os homens). Embora esses números já tenham sido até melhores antes da pandemia de Covid-19, trata-se de um progresso incrível comparado com 1970, quando o brasileiro médio vivia apenas 60 anos.
O recente debate entre o presidente Joe Biden e Donald Trump acendeu uma acalorada discussão, não apenas sobre política, mas sobre os efeitos visíveis do envelhecimento cognitivo. Mas o que seria um envelhecimento saudável? E como proteger nosso cérebro, já que, com o aumento da expectativa de vida, a prevalência de demências tende a aumentar?
Do ponto de vista biológico, o envelhecimento pode ser definido como a relação entre o dano acumulado no organismo e os mecanismos compensatórios para reparar esses danos. Velhice e envelhecimento são conceitos distintos, sendo que o segundo é um processo contínuo e não apenas uma fase da vida. Demências são síndromes e a doença de Alzheimer é a principal causa.
A genética do indivíduo desempenha um papel inegável em vários aspectos desse processo, como na probabilidade de desenvolver certas condições, incluindo algumas demências. Também inegável é a tendência de mudanças cognitivas ocorrerem com o passar das décadas.
A memória operacional, por exemplo, que é a capacidade de manter e manipular informações temporariamente (como lembrar um número de telefone enquanto se procura a caneta), tende a diminuir com a idade. A velocidade de processamento, que é a rapidez com que uma pessoa pode entender e reagir à informação, começa a declinar já na terceira década da vida, tornando tarefas que exigem respostas rápidas mais desafiadoras. A memória episódica, responsável por recordar eventos específicos da vida – como o que você comeu no jantar de aniversário no ano passado -, pode se tornar menos precisa. A atenção seletiva, que é a capacidade de focar uma tarefa específica enquanto ignora distrações (como ler um livro em um ambiente barulhento), também pode ser prejudicada. Por outro lado, a ciência que estuda os determinantes socioculturais do envelhecimento oferece motivos para otimismo. O declínio não é inevitável. E há pesquisas mostrando que certos
Benefícios do Trabalho Voluntário na Prevenção do Envelhecimento Cognitivo
grupos sociais, como o que minha avó participava, desempenham um papel crucial na promoção da saúde cognitiva em idades avançadas. O contato regular com amigos e atividades realizadas em grupo, como os almoços de domingo na associação, podem contribuir para manter a cognição em idades avançadas.
Enquanto o processo de envelhecimento naturalmente traz desafios cognitivos, o envolvimento em atividades sociais e voluntárias pode ajudar a preservar habilidades mentais. No caso de minha avó, seu trabalho voluntário na Ofidas não apenas a mantinha ativa, mas também lhe proporcionava um propósito e conexão com a comunidade.
À medida que envelhecemos, é importante reconhecer que o envelhecimento cognitivo é um aspecto natural da vida. No entanto, existem estratégias que podem ser adotadas para promover um envelhecimento saudável do cérebro. Além do trabalho voluntário, a prática de exercícios mentais, uma dieta equilibrada e a manutenção de relações sociais significativas são fundamentais para preservar a cognição em idades avançadas.
Ao refletir sobre a vida de minha avó, percebo como seu compromisso com o trabalho voluntário e sua participação ativa em atividades sociais foram essenciais para sua saúde cognitiva até uma idade avançada. Enquanto a idade avançada traz consigo desafios únicos, o apoio de amigos e a participação em atividades significativas podem fazer uma diferença significativa na qualidade de vida e no bem-estar mental.
À medida que a expectativa de vida continua a aumentar, é fundamental que exploremos formas de promover um envelhecimento saudável e ativo. O envelhecimento cognitivo não precisa ser encarado como um fardo inevitável, mas sim como uma oportunidade de cultivar conexões significativas e continuar a aprender e crescer em todas as fases da vida. Através do trabalho voluntário, do envolvimento em atividades sociais e do apoio mútuo, podemos enfrentar os desafios do envelhecimento com resiliência e otimismo.
Fonte: @ Veja Abril
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