Sérgio Raphael parado em blitz de soldados rebeldes ao tentar deixar o Sudão. O jogador do Nova Iguaçu, sensação do Carioca, em busca de uma nova vida.
Sérgio Raphael estava aproveitando seu dia de folga em casa quando ouviu sirenes de ambulâncias e carros de polícia se aproximando. Era agosto do ano passado e ele estava em São Paulo, no Brasil. ‘A gente que é de Minas Gerais está acostumado, eu estava bem tranquilo’. Mas a situação era mais tensa do que a de costume nas estradas mineiras.
O zagueiro Sérgio Raphael estava treinando duro no campo quando sentiu uma fisgada na coxa. Era a véspera de um jogo decisivo e ele sabia que precisava se recuperar o mais rápido possível. ‘A gente que é jogador de futebol sabe que lesões fazem parte da nossa profissão’, ele pensou, preocupado com a sua condição física. Mas nada iria impedi-lo de entrar em campo e ajudar a sua equipe a conquistar a vitória.
A trajetória de Sérgio Raphael como jogador de futebol e zagueiro
Percebeu isso quando os conflitos se intensificaram, com tanques militares ganhando as principais vias, aeroportos incendiados e caos nas ruas. Onze meses depois, Sérgio Raphael vive um dos momentos mais felizes de sua carreira como jogador de futebol – tentou a sorte também como modelo.
Ele faz parte do elenco do Nova Iguaçu, sensação do Campeonato Carioca, que vai disputar as finais com o Flamengo (o primeiro jogo é às 17h de sábado no Maracanã). Mas vê um filme, não tão alegre, sempre que se recorda do que viveu no Sudão.
A saga de Sérgio Raphael para mudar de vida e sua experiência como zagueiro
Sua chegada ao país do norte da África repete o caminho de tantos outros jovens brasileiros, a saga para mudar de vida. Minha motivação foi financeira.
O contrato foi muito bom e tinha visibilidade enorme porque o time jogava a Champions da África, poderia se classificar para o Mundial – contou o jogador. O técnico Ricardo Heron Ferreira, que tem uma história no futebol do país africano, levou ao jogador o convite para jogar no Al-Merreikh.
Sérgio Raphael, outros atletas e membros da comissão técnica foram contratados e viviam em um hotel perto do aeroporto de Cartum. A passagem esportiva pelo clube sudanês se resumiu a cinco partidas. Tão logo o conflito começou, o futebol foi paralisado. Os responsáveis pelo clube falaram para a gente ficar tranquilo, que iria passar. Para a gente ficar em casa, evitar sair.
Eles até deram um suporte para a gente, com mantimentos. Mas achavam que iria passar rápido e não passou – recordou. Os confrontos no Sudão começaram em meados de abril de 2023 depois de uma ruptura entre o Exército e os paramilitares.
Encontro com soldado rebelde e a experiência de Sérgio Raphael como jogador de futebol e modelo
A pressão internacional fez com que as forças opositoras aceitassem um cessar-fogo e criassem um corredor humanitário, e cidadãos estrangeiros começaram a deixar o país. Nesse momento, Sérgio Raphael diz que os jogadores não contaram com apoio diplomático brasileiro, estavam por conta própria.
A situação poderia piorar, os passaportes dos atletas estavam na sede do clube e para chegar lá, os jogadores teriam de cruzar as áreas de conflito na cidade. Na data em que eu ia buscar os passaportes, um outro moleque foi comprar comida e foi baleado. Mas no outro dia pela manhã, eu disse que iria, sim. No caminho, os soldados rebeldes me pararam, mas me reconheceram do clube.
Retomada de Sérgio Raphael no futebol e seu papel na equipe do Nova Iguaçu
Ele foi sozinho para o país e filtrava as notícias que enviava para o Brasil. A única pessoa que eu passava as informações era minha irmã. Eu dizia que estava bem, mas sabia que não. A situação era desesperadora – afirmou. O jogador conseguiu recuperar seus documentos. Em seguida, o clube disponibilizou um ônibus para que ele e seus companheiros viajassem até o Egito.
No país vizinho, poderiam tomar um avião para retornar ao Brasil. O percurso até o Egito retratava toda a destruição provocada pelo conflito. Da janela do ônibus, registraram a saga de famílias atravessando a estrada a pé em busca de refúgio. Após chegarem ao Egito, enfim, receberam apoio do Itamaraty, que conseguiu um voo para retornarem ao Brasil.
O Al-Merreikh ainda contava com o retorno dos jogadores brasileiros após a guerra. Porém, os momentos vividos no Sudão abalaram o relacionamento de Sérgio Raphael com o futebol.
Aos poucos, o prazer com o futebol retornou. O Nova Iguaçu começou o Carioca em alta e se manteve brigando na parte de cima da tabela até o fim, terminando a fase de classificação em segundo lugar, atrás somente do Flamengo. O futebol é um meio muito difícil de realizar os sonhos. Passei por um episódio muito difícil, de arriscar a vida e poder perder tudo.
Expectativas de Sérgio Raphael para ajudar o Nova Iguaçu a surpreender
Na semifinal, o Nova Iguaçu enfrentou o Vasco, um dos times que mais investiu na janela de contratações. O jogo de ida terminou em empate, apesar da grande atuação do time da Baixada Fluminense. Na volta, o Vasco precisava vencer e pressionou bastante, mas o sistema defensivo do Nova Iguaçu conseguiu neutralizar as armas do adversário e, em contra-ataque, Bill fez o gol que garantiu a vaga na final do Carioca. Agora, o Nova Iguaçu terá o Flamengo e seu elenco milionário pela frente.
De pazes feitas com o futebol, o jogador quer ajudar sua equipe a surpreender mais uma vez. A gente sabe da dificuldade de enfrentar o Flamengo no Maracanã. O Flamengo é gigante, tem uma torcida que apoia o tempo todo, tem jogadores de Seleção, mas não vamos mudar a forma de jogar. Tudo é possível, vamos trabalhar ao máximo para dificultar a vida deles. Se possível, sair com um título inédito – projetou.
Fonte: © GE – Globo Esportes
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